Arcasi, moradora na favela Nova Holanda, no complexo da Maré, Rio de Janeiro, co-fundou a Coletiva Baobás, grupo de mulheres mães, que através da literatura, da cultura, e das artes, discutem questões como maternagem, saúde mental e acesso. “Precisava de outras coisas que discutissem o direito nosso de ter os nossos filhos vivos”.
Após a pandemia, começou a pensar o que poderia fazer como devolutiva para o território e para o grupo que tinha fundado. Ao entrar no Ler o Brasil, ela comenta: “Minha mente explodiu com essa parada do curso, sabe? Como eu realmente precisava daquilo para me localizar, para lidar com a minha desesperança, com a minha revolta”.
Pontua que as mães na favela são a linha de frente de tudo, “o Ler o Brasil me deu uma perspectiva histórica. Logo em seguida teve o edital para o grupo de leitura, e eu já tinha começado a realizar encontros de leitura, então eu só peguei o fôlego. Com o edital, nos escrevemos, conseguimos e começamos a ler Carolina Maria de Jesus, o Quarto de Despejo”.
O Edital do programa Ler o Brasil para grupos de leitura foi uma oportunidade de finalmente ter os livros desejados pelas participantes da Coletiva, que até então não eram possíveis de ser comprados pelas mães. Quando conta sobre a experiência de poder ler Carolina Maria de Jesus, Arcasi reforça: “ao ler, parecia que ela estava do nosso lado, falando com a gente. A experiência é muito próxima com tudo o que a gente tem pela frente. Até a fome, o racismo, a violência vão se atualizando. Tem diferenças históricas, mas são as mesmas coisas”.
Os encontros realizados a partir do grupo de leitura também se tornaram uma oportunidade para que as mães e as crianças construíssem uma outra forma de convivência. “Nesses encontros passamos a ter acordos entre nós. Enquanto a gente estiver junto, não é permitido violência entre nós, contra as crianças. Nós vivemos em um território violento, então dentro das nossas casas a gente esteja em segurança”.
A biblioteca foi montada durante os encontros do grupo de leitura, levando o nome da avó de Arcasi, “a minha avó foi uma mulher lavradora, do interior de Belém do Pará, foi uma mulher analfabeta, mas foi uma pessoa que me incentivou muito, tudo na minha vida em faço em homenagem à ela”.É um espaço especializado em maternidade, tendo livros que trazem as tecnologias que as mães criam, mas também literatura para as infâncias e outros temas relacionados aos debates da Coletiva Baobá.
Passar no edital do grupo de leitura do Ler no Brasil, deu à Arcasi e às mulheres do Grupo Baobá, fôlego e esperança em passar em outros editais. Hoje, o grupo segue se mantendo firme, com editais públicos voltados à cultura e leitura, não só se colocando enquanto coletiva, mas também enquanto equipe e projeto com impacto no território do Complexo da Maré.
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“Sou ameduca, quer dizer artista, mãe, educadora e ativista. E a ameduca vem muito de uma cultura de auto-nomeação, e também por não encontrar nada que definisse o que eu sou no mundo. Eu sou essa ameduca”, Arcasi, nascida em Belém do Pará e hoje moradora do Complexo da Maré, Rio de Janeiro, inicia a entrevista assim, de auto-nomeando.
Em Belém, Arcasi teve seu primeiro contato com movimentos culturais, a partir de um centro comunitário chamado Tiradentes, do bairro de Marambaia. Encontrava um lugar para si na escrita, na leitura, na poesia e na música.
Com a meta de fazer universidade, iniciou no curso de letras, e ao concluir, decidiu também fazer Ciências Sociais na Universidade Federal do Pará. Porém, migrou para o sudeste para se profissionalizar como artista, “esse é um campo muito difícil no norte do país, todos os recursos ainda são concentrados no sul e no sudeste. E talvez porque é importante, né? Conhecer outros lugares, outras formas de viver.”
Ingressou em História da Arte, na Universidade Federal do Rio de Janeiro, e passou a morar no Complexo da Maré, na favela da Nova Holanda. Dentro do Complexo, e da Universidade, passou a ter contato com diferentes mulheres, brasileiras e de outros países.
“A favela me educou. Comecei a concentrar meus estudos, minhas pesquisas, em coisas que fossem interessantes para o meu território. Me tornei mãe no pós pandemia, depois de tudo o que passamos na favela, com operações policiais, pandemia, com avanço da extrema direita, comecei a me movimentar nesse sentido de como fortalecer este território”.